sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Darwin e a Pirâmide Social - Carta a um amigo filósofo

Estava andando pela avenida central de Nova Friburgo, exibindo meu novo adquirido bigode, quando se acerca de mim um estranho: "Gui? Sou fulano..."
Conhecíamo-nos apenas virtualmente, através das listas. Já havíamos tido alguns "pegas pra capá" dialéticos. E agora lá estava em carne e osso o famoso filósofo friburguense me agarrando pelo braço, falando comigo.
Algo assim como se um personagem de história em quadrinhos, digamos o Fantasma, me aparecesse mascarado com o anel de caveira no dedo, sorrindo para mim em qualquer esquina do mundo. Nada demais nestes nossos tempos esquizofrênicos. Fomos tomar um cafezinho, pois o café, já o sabemos, é o combustível dos escribas. Papeamos alguns minutos e nos separamos. Escrevi uma carta de reflexões sobre o conteúdo dessa conversa que compartilho aqui (sem mencionar nomes):



Amigo,
(carta tête-a-tête)

depois que nos encontramos fiquei refletindo sobre algumas coisas que vc disse, e, reverberando ... te envio então algumas das minhas reflexões para que faças o que quiser com elas (aliás, nem é necessário mencionar... pois uma vez que uma ideia sai de uma cabeça e entra em outra, o metabolismo mental de cada um se encarrega do resto...  :-)

1. qdo vc comentou que um nosso amigo comum lhe propos uma reunião entre nós, algo que ele também havia me proposto, e da tua resistência, por querer ficar entre os teus pares, já mais ou menos compartilhadores da mesma visão, etc, para evitar discussões chatas, etc... tive a vontade de te contar sobre como eu aprendi a jogar xadrez (de um modo que estou invicto há uns 20 anos).


Meu tio Luiz era melhor do que eu, quando eu tinha 14 anos de idade.
Fazíamos então jogos abertos, em que se podia voltar atrás se um erro grave fosse constatado por um de nós. Na prática não jogávamos um contra o outro, mas ambos com as pretas e com as negras. Fazíamos comentários, análises. Escrevíamos os jogos, analisávamos depois os erros e as possibilidades mútuas. Anos depois, ao estudar o método científico, dialético, entendi que o objetivo da antítese é fortalecer a tese, não destruí-la.  Tese e antítese são aliadas de uma mesma causa: a causa do aprimoramento da verdade. Vi semelhanças entre o método e a maneira como eu e meu tio Luiz jogávamos xadrez.

No caso da "verdade" filosófica, sociopolítica, como resultante de um processo dinâmico orgânico feito de psiquê, anima, seres humanos (como a vida), ela é e será sempre intangível. Daí a minha teoria da dízima periódica, ou pi, onde o que importa não é o resultado factual, o número exato,  mas a DIREÇÃO CERTA.

Infelizmente, nestes tempos de fim de mundo, onde a economia entra por um gargalho cada vez mais fechado, o meio social se carrega cada vez mais de emoções, sentimentos e motivações baixas. Temos sérias razões para ficar desconfiados do próximo (o Outro é o Inferno - Sartre).

2. Falamos um pouco também sobre a natureza do ser humano e sua relação com a natureza, no sentido darwiniano, a lógica seletiva que constrói a pirâmide social em que vivemos e a máxima de um outro amigo pensador: "O Capitalismo é Invencível".

Deixo a seguinte reflexão:
O Homem é a única espécie que, ao invés de se adaptar ao meio ambiente, faz o meio ambiente se adaptar a si mesmo. Neste sentido não somos mais produto do meio natural, mas produtos do meio humano. Mais do segundo do que do primeiro. F.Gullar diz: "a vida é uma invenção". Sim, invenção cultural. O Homem completamente sem cultura não se diferencia muito de um gorila. As vezes reflito que não podemos mais usar o argumento evolucionista darwiniano: somos, cada vez mais, os próprios desenhistas ou modeladores de nós mesmos. Estamos chegando a um ponto que - através da manipulação genética - poderemos desenhar novos seres humanos, virtualmente, ou fazer mutações humanas (algo agora ainda inadmissível religiosamente ou eticamente, mas que dentro de alguns anos será perfeitamente aceitável, pois sabemos: conceitos éticos se ajustam à realidade, nunca o contrário). Podemos presenciar a criação de espécies híbridas humanas para explorar o espaço ou o fundo dos mares; ou para resistir as condições do terrivel "novo planeta Terra" que se avizinha. Talvez seja este o "fim da humanidade" e o "fim do mundo" como conhecemos.

De qualquer modo, me atirei nesse exercício de ficção científica apenas para demonstrar que, sim,
  podemos (e, nessa altura do campeonato, devemos) assumir responsabilidade sobre a nossa natureza. O capitalismo não é natural à natureza humana ... basta decidirmos o contrário.

Abçs

Gui Mallon