domingo, 28 de outubro de 2018

CARTA DE DIVÓRCIO À MINHA ADORÁVEL FAMÍLIA FASCISTA

Escrevo-lhes na véspera do domingo das eleições de Segundo Turno, ainda sábado, 27 de outubro de 2018. Estamos vivendo um momento muito trágico na história do Brasil e do Mundo, e todos sabem o porque.

Nunca imaginei que presenciaria como testemunha ocular, histórica, no meu amado país o Brasil, a ascensão das ideias fascistas que chegaram a dominar a Europa nas décadas de 1920 e 1930. E mais, agora nas mentes e corações de pessoas tão próximas e queridas. Personagens que eu vi em muitos filmes da Segunda Guerra Mundial, representados por atores, agora vejo passando por mim em carne e osso, em cada esquina do Brasil.

Parece uma versão real do filme "Walking Dead", o filme dos zumbis contagiosos. Vivemos uma doença psicossocial contagiosa, uma forma de psicopatia coletiva, induzida pelas redes sociais (principalmente o Whatsapp).

O que acontece no Brasil é uma explosão muito mais forte, ampla e virulenta da onda neofascista que assola o mundo.

Vivi para testemunhar minhas tias católicas seguirem as posições de Edir Macedo, o "Bispo" da Igreja Universal (que também apoia Bolsonaro). Vivi para ver estes "católicos" e "cristãos" adorarem um homem que é a favor da PENA DE MORTE e da TORTURA... mesmo considerando-se que Jesus morreu torturado na cruz. Que cristianismo é este?

Vivi para ver um candidato presidencial, Bolsonaro, usar termos como:
“Não vou estuprar você porque você não merece” (a uma Ministra)
“Tenho apartamento em Brasília pra comer gente” (a uma jornalista)
“Quem busca osso é cachorro” (a familiares de vítimas de uma guerra, como ele mesmo classifica)
“O cara tem que ser arrebentado pra abrir o bico” (numa entrevista)
“O único erro foi torturar e não matar” (numa entrevista)
etc, etc, etc

Vivi para ouvir um candidato à presidência dizer para uma multidão enfurecida que ele iria "metralhar" seus oponentes. Que ele é favorável à Ditadura Militar e que, aos seus oponentes, restaria a MORTE ou o EXÍLIO.

Pois EU SOU UM OPONENTE DE JAIR BOLSONARO.
E DE TUDO QUE ELE REPRESENTA!!

Vejo dois tipos de eleitores fascistas no Brasil atual:

a) os que nem sabem o que é fascismo, que mal abriram um livro de história, que simplesmente seguem o estouro da manada do ódio, levados por falsificações grotescas de fatos e fotos. Cristãos que usam o whatsapp como se fosse a Bíblia.

b) e os que estão neste movimento conscientemente, porque simplesmente encontraram na onda de ódio a redenção para as suas frustrações existenciais. Neste segundo grupo, há os que querem "normalizar" o monstro; como se palavras não tivessem significado (e consequências).
Na realidade estes dois grupos de eleitores se recusam a aceitar o século XXI, a complexidade da modernidade.

Existe um novo universo de identidades culturais que vocês não compreendem, e se sentem excluídos desta nova realidade incompreensível.

Vocês acreditam que podem parar o relógio da história e voltar no tempo. Bolsonaro diz categoricamente que "quer voltar ao Brasil de 50 anos atrás". É compreensível. Eu preferiria fazer uma visitinha a Alemanha de 1740, só para ouvir J.S. Bach tocar seus maravilhosos concertos na Igreja de Leipzig... mas, enfim, não é possível.

Os bolsonazistas serão derrotados, mesmo que vençam as eleições.. é uma questão de tempo.
A direção dinâmica da história não poderá ser retida por muito tempo. Se os fascistas tivessem estudado um pouco mais de história, saberiam disso.
Por fim, quero declarar isto:

Para mim é INACEITÁVEL que vocês considerem a possibilidade de eleger um fascista.

Talvez tanto quanto para vocês aceitarem a ideia de ter a antropofagia (comer carne humana) como política de estado.

Não só isso, Bolsonaro é um ogro, um homem com mentalidade da idade média. E quando digo: "Bolsonaro é medieval", digo não como metáfora, mas como fato!

Bolsonaro é mesmo um resquício cultural da ala escravocrata, da baixa nobreza rural, que iniciou a colonização no Brasil. Estes portugueses estavam mentalmente na Idade Média, considerando-se "cruzados" cuja missão era "converter", escravizar ou exterminar.

Mas não escrevo para discutir história ou política com vocês, é uma questão moral.
Vamos ser honestos uns com os outros.

Não importa em que classe de eleitor bolsonazista vocês se incluem, ingênuos ou conscientes, serão excluídos da minha vida.

Escolher a inclusão no lado de lá, do lado dessa gente que sai dando tiro matando gente por aí; do lado de Alexandre Frota, Aécio Neves, Edir Macedo e outras excrescências homúnculas... isto realmente me excluirá definitivamente de suas vidas.

Não que faça muita diferença para vocês, porque já vivíamos um distanciamento, mas faz muita diferença para mim. Na verdade, já havia me afastado de alguns membros da família antes e o resultado para mim foi como um bálsamo! Minha vida melhorou em todos os sentidos. Creio que as deles também.

Espero então de coração que este nosso divórcio definitivo tenha o mesmo resultado nas suas vidas.
Não guardo rancor, quero na verdade guardar as boas lembranças dos bons momentos que compartilhamos, por isso me afasto.

Tenho a lembrança vívida destes momentos, como ao lado da minha amada tia Natalina, do meu querido tio Luiz, ambos falecidos.

(Não posso nem imaginar tio Luiz apoiando Bolsonaro...)

Queria, finalizando, expressar um pedido de desculpas aos familiares que NÃO votarão Bolsonaro e receberam esta carta. E dizer a estes parentes que, se desejarem, sentirei alívio e prazer em manter contato.

Respeitosamente,
Guilherme
(Gui Mallon)