sábado, 12 de novembro de 2011

ARTE CONTEMPORÂNEA no FINAL DOS TEMPOS

DEMOCRACIA - Obra coletiva: 220 mãos. 2700 x 600 mm. Técnica: aquarela, guache, lápis, cusparadas, hands on, etc, sobre papel 120 gr. Posteriormente digitalizado e montado em um mosaico fotográfico de 36 peças.






Em julho de 1999 estava eu com o meu grupo Gui Mallon Ensemble na terraça do Grand Hotel Suisse Majestic, tomando café da manhã em frente ao estonteante panorama do Lago Geneve . O grupo era formado por alguns dos melhores músicos suecos: Jonas Knutsson e Anders Hagberg (sax e flauta), Santiago Jimenez, David Bjorkman (violinos), Jonas Franke-Blom (celo), Stafan Wingefors (baixo), Finn Bjornulfsson (percussão), onze ao todo.
Estávamos ali tirando uma foto clássica, celebrando o estrondoso sucesso dos nossos dois concertos no Festival de Jazz de Montreux, que foram gravados ao vivo e seriam lançados anos mais tarde pela gravadora americana Adventure Records. Este momento, segundo muitos, talvez tenha sido o topo da minha carreira musical.

Até aí eu tinha investido todos os meus esforços em reprimir (sim, esta é a palavra: reprimir) minhas necessidades de expressão artística por outros meios que não a música. Visava o triunfo profissional e pessoal através do único caminho que nos é permitido enxergar: a especialização máxima. Exatamente neste ponto, em que eu deveria cash it in, (faturar), tive uma tremenda crise existencial. Como se eu fosse um homossexual reprimido que subitamente explode. Larguei a produção dos meus 3 grupos e fui me refugiar numa praia qualquer no Brasil. Lá comecei a pintar
FACE FEMININA - 290 x 190 mm. Aquarela
e escrever poesia, como fazia quando era adolescente, sem nenhuma outra intenção que não o simples prazer estético.


Hoje, relativamente em paz comigo mesmo, depois de ter feito posgraduação em Artes na Escola Superior Valand da Universidade de Gotemburgo, ter abandonado meus grupos e minha firma de produção musical, ter me metido em projetos artísticos coletivos e multimidiáticos na Suécia e no exterior, lançado CDs e livros escritos, gravados e ilustrados por mim; feito traduções de manuais para maquinaria de hidroelétricas, ter atuado como ator, etc, entendi que a especialização que o sistema econômico nos impõe não é natural ao ser humano.

Hoje me considero um artista conceitual. O conceito que eu busco, na verdade desde o início dos meus primeiros esforços de expressão artística através da música até a minha atual militância cultural, é uma utopia: busco a liberdade completa de expressão do conteúdo através da liberdade formal completa. Este é um projeto político-artístico, no sentido político que Josef Beuys dava à arte, como “Ciência da Liberdade”.

É impossível fazer arte sem se expressar politicamente e se relacionar aos problemas sociais que nos cercam. Uma arte que se pretende “apolítica” já faz a opção política de auto excluir-se do esforço coletivo, mas não se exclui do processo político: atua como vetor pseudoinerte, sendo carregada pelas decisões do coletivo. A arte que eu busco diz respeito ao maior problema com que se defrontou a espécie humana: o problema ambiental. Um problema que está nos levando ao impasse malthusiano. Minha arte se relaciona a nossa equivocada visão de felicidade, onde TER é mais importante do que SER.  Estes valores foram acentuados por Henry Ford (inventor da produção e do consumo em massa) e seu estereotipado sistema de produção em série, onde a hiper-produção e o hiper-consumo nos levaram a hiper-especialização.

O mercado continua a funcionar nestas premissas: manufaturação em série, maximização da lógica da efetividade, expansão máxima de si mesmo. A intervenção do Estado nas artes deveria objetivar a proporcionar uma reserva natural que garantisse os direitos e liberdades dos cidadãos. Mas como, se funciona utilizando-se da mesma lógica de efetividade e maximização expancionista do mercado?

Sobre minhas relações com o estado, escrevi o ensaio-testemunho abaixo
(para leitores categoria meio-pesado):



________________


MACROARTE E O ESTADO ARTISTA 

Uma utopia/distopia sobre um Estado que dominaria a quintessência da arte de fomentar arte democrática - feita pelo povo para o povo - através de políticas culturais.

1. Eu, artista-Estado
Quando estava concluindo este artigo me vi engolfado na catástrofe das chuvas na Região Serrana do Rio de Janeiro, onde moro. A experiência do meu drama pessoal em meio a um ambiente apocalíptico determinou a cor das pinceladas finais ao artigo. Peço perdão então aos acadêmicos pelo que pode ser considerado excessivo uso de linguagem metafórica, mas menciono aqui em minha defesa o cientista James Lovelock, no seu pertinente livro “The Revenge of Gaia”, que sugere a linguagem metafórica como alternativa linguística a incapacidade da ciência de descrever (e muito menos solucionar) problemas de complexidade multidimensional como o problema ambiental, que necessita ser compreendido pela maioria maciça da população humana para poder ser enfrentado realisticamente. Não podemos resolver o problema ambiental sem envolver sua causa capital; os próprios seres humanos. Um problema urgentíssimo, que não pode esperar que a totalidade da população humana cole grau em geologia. Um problema mais que científico; cultural, e por conseguinte, político. Um problema que tem que ser encarado com visão holística, com lógica sistêmica, além do alcance do raciocínio reducionista baseado na lei de causa e efeito.



Da mesma maneira, creio que o maior problema das políticas culturais também é a exclusão provocada por uma linguagem protocolar, acadêmica, cunhada entre 80-50 anos atrás, que torna o acesso aos recursos do Estado no campo da cultura através dos editais um privilégio das classe A e B. Especialmente daqueles instruídos nas universidades federais. Este nicho, ou capitania hereditária cultural, não importa que Estado se pretenda construir ou que facção política esteja no poder, defende as fronteiras do seu território dentro do Estado com unhas e dentes, principalmente através da linguagem estatal materializada na máquina burocrática, forjada por eles mesmos, e que sempre se manterá inacessível a maioria da população (enquanto perdurar o atual sistema econômico).  

E neste ponto, reconhecendo que o planeta se apequena e que tudo está cada vez mais interligado e interdependente, fazemos um círculo holístico completo e voltamos a Gaia, ou melhor, a guerra que estamos travando contra Gaia (ou nós mesmos). E aqui faço uma analogia a outra das metáforas de Lovelock: O que aconteceria se o Brasil invadisse o território de um país vizinho? O país vizinho declararia guerra ao nosso país. Pois invadimos como espécie dominante o território de outras espécies. E estamos, sem saber, em guerra contra Gaia, o pior e mais formidável inimigo que poderíamos ter. Precisamos urgentemente de um tratado de paz que só poderá ser escrito com ajuda da arte e da cultura. Arte, aqui, considerada não como produto mas como a “ciência da liberdade” do artista alemão Josef Beuys, como a semente que é cultivada pela cultura, como estética que busca a ética (individual e política).

Apesar de já ter realizado muitos projetos culturais que envolveram verba pública no exterior, apenas duas vezes – em toda a minha vida – tive a oportunidade de realizar projetos artísticos autônomos para o Estado brasileiro. Na primeira vez, nos meus vinte anos, antes de iniciar meu longo exílio por países do Hemisfério Norte, toquei com o trio Pau e Corda uma série de concertos didáticos em escolas públicas de cidadezinhas do interior do Estado do Rio de Janeiro. Na segunda vez, já como artista plástico, quando fui agraciado com o Prêmio Interações Estéticas (Funarte-MinC) para realizar o Mosartes-Mosaico de Artes&Gente, um projeto multi midiático de criação coletiva na Oficina Escola de Artes de Nova Friburgo/RJ, prêmio este que me trouxe de volta ao Brasil após uma ausência de 25 anos. 

Destas duas vezes ficou a sensação de enorme entusiasmo e orgulho por estar prestando um serviço público ao meu país. Na verdade, sentia-me como um pequeno representante do aparato estatal brasileiro no campo cultural; sua parte centesimal, ou melhor dizendo, milionesimal. Estava sendo pago por verba pública, o sagrado sangue do povo, e tinha que justificar cabalmente aquele investimento. Assim pensava (e ainda penso). Na extensão destes sentimentos e destas responsabilidades, estava representando algo muito maior do que eu, o artista, mas o eu-responsável pela aplicação de uma política pública cultural que seria forjada in situ, no campo de ação.


Não poderia tocar qualquer música ou apresentar qualquer conceito estético sem antes, por escolha própria, ter estas ações antecedidas por reflexões sobre seu conteúdo social, seu alcance formativo (no sentido político, cultural) e seu significado simbólico e histórico, para que estas fossem então contextualizadas a partir destas reflexões. Neste sentido – e nestes campos de ação periféricos aos centros urbanos onde se plasma os consensos políticos culturais do país - desde a escolha entre dois acordes até a escolha entre duas cores, as pequenas decisões que eu tomei tornaram-se política pública aplicada. Tornei-me um opus in locus ambulante. Fui uma fronteira do Estado brasileiro. Eu, artista-Estado.


Após minha segunda intervenção como “artista-Estado”, durante este magnífico período experimental que foi a gestão Gil-Juca, tive a oportunidade de participar ativamente de palestras, exposições,

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Biopoesia


O DNA DAS SITUAÇÕES

Estou estudando o "DNA" das situações. 

Toda situação tem um DNA,
que é o código,
formato ou instruções
que coordenam 

                       o desenvolvimento e funcionamento 
                       da situação.


Normalmente este código se estabelece 
no INÍCIO da coisa
                        (sua célula mater).

Analisando o início da situação 
entenderemos o porque da situação ser como é. 
Se quisermos mudar,
teremos que mudar as instruções 
                  (regras de comportamento) 


Porque: 
MESMAS ATITUDES 
LEVAM AOS MESMOS RESULTADOS. 
Reflitam! 
Daí a necessidade da História.






(estas reflexões levarão a várias análises sobre o momento atual
na Arte, na Cultura, na Política e na Economia ... aguardem e participem!)


quarta-feira, 7 de setembro de 2011

BRASIL 11 GIRASSOL



Meu Brasil foi-se embora 
mas eu não fui
tão fácil assim
Fui embora do Brasil
mas o Brasil não foi
(de mim)

Azulão desmancha o verde
das araras, maritacas

Da estrada avisto o mar
desde a Mata Mantiqueira
Ê  Brasil, serra-menina
Ê menina brasilêêra

Meu Brasil foi-se embora
mas eu não fui
tão fácil assim
Fui embora do Brasil
mas o Brasil não foi
(de mim)


Brasil-viola, caipira, vidadura, sucupira. 
Café com rapadura
Canta louro encantado: 
"lampião de gás, lampião de gás, 
quanta saudades, você me trázzz".
Areias coçam, queimam o dedo
Tatuí, água marinha

Não é o girassol que gira ao sol
mas o sol que gira ao girassol

Meu Brasil foi-se embora
mas eu não fui
tão fácil assim
Fui embora do Brasil
mas o Brasil não foi
(de mim)

terça-feira, 6 de setembro de 2011

I've Got You Under my Skin

Frank Sinatra na década de 30,
preso por andar com mulheres casadas




Entre as canções mais emblemáticas da música popular americana do século XX situa-se I've Got You Under My Skin como uma das mais populares.

Composta por Cole Porter em 1936, alcançou o sucesso que a tornou um standard imprescindível na voz de Frank Sinatra, dez anos depois, em 1946. No link abaixo podemos ver uma interpretação irretocável do cantor, no auge da sua carreira, para a rede de tv ABC.

Muitas vezes me perguntei o porquê da música pop internacional ser dominada até hoje pela língua inglesa. Há várias hipóteses, entre elas a que parece mais plausível é a de que esta tendência acompanharia ainda o monopólio inicial imposto pelas indústrias fonográfica e cinematográfica, inauguradas no início do século passado. Os primeiros a explorar o mercado estabeleceram os padrões de consumo, de produção e os sistemas de difusão e distribuição; terminando por criar mercados cativos e aculturados. Excessões não quebram a regra, apenas a justificam; como foi o caso do tango na década de 30, do surto de música caribenha (rumba, salsa) no final da década de 40, da bossa nova na década de 60, da era do rock-pop inglês iniciada também na década de 60, etc. Todos estes produtos mais ou menos aculturados foram embalados ao modo americano. A "America" aqui, até então, vista como terra de criatividade, liberdade e dinamismo cultural imbatível.

I've Got You Under My Skin
pode ser entendida como a afirmação plena de um modus vivendis. Sinatra, quando gravou esta canção, estava no ápice do fenômeno que protagonizou e inaugurou; como primeiro ídolo de jovens adolescentes fanatizadas, abrindo um mercado que foi explorado mais tarde por Elvis Plesley, os Beatles e muitos outros.  A letra  fala de amor romântico de uma maneira sensual, quase que explicitamente erótica, fazendo uma relação ambígua entre o "amor interiorizado, dentro da pele" com o "amor de pele". A música retrata o sentimento da geração da Segunda Guerra Mundial, que, após presenciar por seis anos o espetáculo macabro do extermínio de 50 milhões de seres humanos, ansiava agora pela "vida". Viver a vida intensamente, sem limites, expandir, amar, procriar, etc.

Muitos aspectos da cultura contemporânea são ainda determinados por aquela tendência do pós-guerra. A mais importante é a que mudou o paradigma existencial mais fundamental da vida dos nossos avós: a relação entre objetivo e tempo. As gerações anteriores faziam planos para muitos anos; casar (relação sólida), obter um emprego sólido e comprar um imóvel de moradia a prazos de perder de vista. Alguns entre nós ainda podem, talvez, ter vivenciado estes valores que vão se tornando obsoletos. Mas o que se estabeleceu cada vez mais como tendência dominante no pós-guerra foi o "Aqui e Agora". Essa tendência se amplia com a crescente expansão do ateismo e do pragmatismo. Ela explica desde a cultura das drogas até a super obesidade atual.

Estamos vivenciando agora o "Fim do Mundo". Pelo menos daquele mundo subjugado inteiramente ao domínio econômico, político e cultural do CASE-consenso anglosaxão europeu. Os monopólios políticos culturais vão se rompendo. Mas sabemos que os espaços vazios, na dinâmica histórica, tendem  a ser ocupados por alguma outra coisa. O que virá
? Ou melhor, existe ainda algum espaço vazio a ser ocupado nesse nosso mundo pós-demográfico?

Frank Sinatra cantando I Got You Under My Skin:
http://www.youtube.com/watch?v=5yqGujr2-Jw&ob=av3n


terça-feira, 23 de agosto de 2011

O SISTEMA CULTURAL BRASILEIRO - Autismo Socioeconômico

Palácio Capanema no Rio de Janeiro - sede da Funarte e do MinC-RJ
Recebi panfletos de servidores públicos da área cultural pedindo apoio às suas justas reinvidicações de aumento e expansão do funcionalismo. Meu primeiro impulso foi pular da cadeira e ir juntar minha voz aos seus gritos na praça pública. Certamente! Claro! Óbvio! Precisamos de mais servidores,  mais dinheiro,  mais tudo pra cultura. Mas depois parei no meio do salto (imaginem em câmera lenta: um salto parado no ar ...) Refletindo. Primeiro, já não se junta mais gente nas praças públicas, coisa do passado. A gente se reúne nos espaços sociais cibernéticos. Segundo que... bem, vou tentando explicar abaixo.

Entendo a posição dos servidores,  mas aqui,  mais uma vez,  ME OPONHO! Sem uma discussão, primeiro, do papel do estado e das instituições na cultura, sou contra. Porque aí estaríamos apenas dando continuidade a algo que não funciona mais.

Tenho que apontar para o paradoxo econômico que eu vou entitular "VAZAMENTO". Metaforizando, caros artistas e gestores, se temos um vazamento na caixa d
água o que temos que fazer? Tapar o vazamento ou suprir a deficiência provocada pelo vazamento AUMENTANDO A ENTRADA DE ÁGUA? O "vazamento" é a institucionalização brutal da produção artístico-cultural iniciada pela lei Rouanet nos anos 90. Nada mudou, pelo contrário, o problema se agigantou. Continuamos a ser geridos na cultura por "piloto automático". O sistema se automatizou, transformou-se numa espécie de coluna dorsal, criou vida própria.

Temos, infelizmente por um tempo demasiado longo,  nos acostumado com o desperdício geral de verbas públicas. Nem questionamos mais o que estamos fazendo, queremos apenas continuar a fazer o errado (pois ali no meio há algumas coisas certas) e continuamos a empurrar os problemas estruturais para outras esferas (não nos pertence). Estaríamos sofrendo de autismo socioeconômico
?
Presenciei eventos MinC-Funarte há um ano atrás a custos de 200.000 reais que contaram com um público de 100 pessoas em 1 semana (2.000 reais por cabeça !!)

Aqui vos envio alguns dos meus esforços, de outubro de 2010, no sentido de sensibilizar os gestores públicos, naquele momento, para o problema da má versação de verbas. Já em junho de 2009 havia avisado a todos em uma conferência na Funarte de SP que "a festa ia acabar". Não porque o próximo governo seria "mau", mas porque a CONJUNTURA ECONÔMICA MUNDIAL iria mudar radicalmente pós-2010.

Se vocês tiverem saco pra ler; leiam, discutam e divulguem pra quem quiser (infelizmente ainda sou homem de antigamente, que me mantenho atrás do que digo e escrevo). Podem, definitivamente, ler e me cobrar depois a qualquer tempo do resto das nossas vidas o seguinte veredito:

NÓS NUNCA MAIS TEREMOS AS VERBAS CULTURAIS
QUE TIVEMOS NOS ANOS GIL-JUCA !!


E, infelizmente, fez-se MUITO POUCO com os 4-5 bilhões de reais que jorraram na cultura. A relação investimento-prestação apresentou um índice sofrível em termos de conquistas perenes.O encontro autocrítico proposto com os gestores, naturalmente, jamais aconteceu.

Desnecessário dizer que todos se divertiram muito com os bumba meu boi falsificados da classe média alta (ONGs) travestida de cultura popular, etc. Depois foi todo mundo pra Londres fazer compras, os pobrezinhos dos gestores públicos ... que hoje estão aí nos bastidores instigando os bois de piranha a passar seus chapéus raivosamente pelos órgãos públicos.

É triste todo este espetáculo de inconsciência e irresponsabilidade política! Hj a atual administração, independente dos possíveis e justificáveis questionamentos; paga o pato. Há pouquíssimo espaço para manobras. Eles herdaram uma camisa de força orçamentária.

Abçs
Gui Mallon

__________________________


---------- Forwarded message ----------
From: GUI MALLON <guimallon@gmail.com>
Date: 2010/11/9
Subject: Re: PROPOSTA DE REUNIÃO AUTOCRÍTICA
To: X, Y e Z


Prezados X, Y e Z


Ontem fui informado por X e Y  que nos encontraríamos aqui hj, terça-feira, dia 9  às 9.00 hs da manhã. Escrevo as 7.50 da manhã. Por sugestão do X, retirei desta lista o nome de W, me reservando o direito de consultá-lo posteriormente, e independentemente, sobre o tema deste nosso encontro. Naturalmente, sempre com o compromisso de não citar as vossas colocações (se assim o desejarem).

Este cuidado se deve ao fato do natural dilema que se apresenta ao pessoal vinculado ao MinC, a confusão entre "falar pela instituição" ou por si mesmo. Proponho convencionar que estaremos falando como militantes, pessoas, CPF, ainda assim com este termo informal de sigilo responsável, de fidelidade e respeito. Adiciono dois pontos de reflexão ao que já foi instigado anteriormente

POLÍTICA CULTURAL – ANÁLISE CRÍTICA & PROPOSTAS DE APERFEIÇOAMENTO ESTÉTICO/ÉTICO/METODOLÓGICO
1. Por que o Cultura Viva? (ponto de vista do artista)
A FORÇA CENTRÍFUGA QUE REGE A ARTE BRASILEIRA
A produção artistico-cultural no Brasil, no contexto dos últimos dois decênios até agora (em novembro de 2010), se dá, quase que exclusivamente, através de instituições estatais ou privadas. Estas últimas classificam-se ou declaram-se em duas categorias: comerciais ou sem fins lucrativos. Mas, depois do “anistianismo fiscal”  implantado pela lei Rouanet, todas estas categorias institucionais tem um ponto em comum: a busca da verba estatal. Os poucos artistas que se aventuram fora deste círculo institucional terminam por se enquadrar, cedo ou tarde, em uma ou outra categoria institucional de produção artística. Fora deste círculo restam apenas aos artistas o mercado, o mecenato privado, a procura de alguma fonte de renda não proveniente de atividade artística – ou – a labuta dos artesãos, feirantes, músicos/artistas de rua, entre outros, que estabelecem uma relação direta com o seu público, sem intermediários, geralmente em produções de baixo ou baixíssimo orçamento. Ainda assim, caso estas produções independentes atinjam um nível de grandeza que as levem a expandir-se além do seu círculo original, para o grande público, sentem a irresistível atração gravitacional do monólito institucional cultural brasileiro.

Em linhas gerais, enfim, é este o atual meioambiente cultural do país no qual o artista contemporâneo desenvolve sua arte. O mais importante diferencial do Cultura Viva (no meu entender, sua principal virtude) foi tentar mudar os paradigmas de qualidade em que se montavam as políticas culturais deste sistema, antes excessivamente fundamentadas no CASE - consenso estético anglosaxão europeu – e agora, buscando privilegiar o que se convencionou chamar de cultura popular brasileira; arte e cultura de raiz, tendo como público os menos favorecidos.

 
TODO ECO É OCO


Os incontestáveis avanços que este sistema cultural proporciona; o massivo patrocínio de produções artísticas, se evidenciam no atual ciclo extraordinário de expansão da indústria cultural no país.

Mais produções mais verbas → mais produtores → mais burocratas → mais cursos universitários de produção/gestão cultural → mais produções →

O coletivo é formativo. O coletivo dá forma a quê? A padrões de comportamento. Fazendo uma analogia com a formação de um ser humano, foi apontado como uma das causas da superioridade do Homem sobre outras espécies o fato do período formativo humano (infância, adolescência) ser bem mais longo e lento. No atual sistema cultural a arte parece já nascer dentro de um sistema coletivo formativo/informatizante/distribuidor/tipificador. A arte contemporânea brasileira já nasce adulta, cínica, institucionalizada. O sistema atual - BASEADO EM ECOS DE CONCENSOS - proporciona, cada vez menos, o necessário espaço lúdico para o experimento. E por que este espaço é necessário? Uma boa reflexão: Por que é necessário? Não estou falando de didática da arte, mas de invenção.

Talvez tenha chegado a hora, agora, de pisar no freio, tentar libertar a arte brasileira de consensos questionáveis e da excessiva institucionalização.

2. O DESENVOLVIMENTISMO E A QUESTÃO DA VERBA PÚBLICA


Não há como pensar qualquer coisa neste início de século (incluindo políticas culturais, arte, ciência, etc) sem ter como pano de fundo o problema ambiental.  
O desperdício de recursos  que representa políticas públicas mal planejadas não será mais possível. Deixo aqui, então, a seguinte reflexão:


nosso planeta não tem mais recursos naturais
para o crescimento econômico
necessário à sobrevivência 
do atual modelo econômico 


É simplesmente isso. (Qdo será que aparecerá alguém com coragem de encarar e nos revelar esta verdade?). A crise de escassez que se avizinha é gigantesca, está relacionada ao petróleo e virá no CURTO PRAZO. Seus sintomas já são sentidos pela comunidade mundial, com o princípio da guerra cambial, sinais de impotência da economia americana e européia, o virulento ressurgimento do pragmatismo da real politik nas relações políticas internacionais - que tantas guerras causou no passado recente.

O problema da escassez nos afetará a todos, cedo ou tarde, e tem três vertentes:
petróleo, água e terras cultiváveis.

A QUESTÃO DA ÁGUA
De acordo com o Comitê para Assuntos Climáticos das Nações Unidas, A escassez de água potável atinge 2 bilhões de pessoas. Nesse ritmo, dentro de 25 anos, serão 4 bilhões.


Os glaciares do Himalaia, por exemplo, que são a fonte das maiores bacias hidrográficas da Ásia,  podem desaparecer em 2035 (!!) à medida que a temperatura se eleva. Índia, República Popular  da China, Paquistão, Bangladesh, Nepal e Mianmar podem sofrer com inundações, seguidas de estiagem nas próximas décadas. Só na Índia, o Ganges provê água potável e para a o cultivo para mais de 500 milhões de pessoas. O problema não se restringe apenas a Ásia, mas ao planeta como um todo. Teremos o pertubador impacto de centenas de milhões de refugiados batendo às nossas portas dentro de alguns anos.

A QUESTÃO AGRÁRIA
De acordo com a mesma fonte, cerca de dez por cento das terras potencialmente férteis do planeta já se converteram em desertos, e outros 25% estão em processo de desertificação. Todos os anos são perdidos oito milhões e meio de hectares (80.000 km2) apenas por causa da erosão e sedimentação.  Mais de vinte milhões de hectares (200.000 km2) de florestas tropicais são devastados todos os anos. É uma Itália por ano.

A QUESTÃO ENERGÉTICA
Alguns, sem conhecimento científico básico, argumentam que o Homem con quistará outros planetas. Seria mais fácil colonizar o fundo do mar - por si só uma tarefa gigantesca ou quase inviável - do que colonizar a Lua ou Marte. Para isso teríamos que ter pleno domínio da fusão nuclear, o que não acontecerá antes de 50 anos. Aliás o próprio fim da era do petróleo, pela escassez de recursos para investimentos em novas tecnologias que este fim representa, põe em risco o início de qualquer outro ciclo virtuoso de crescimento econômico.
Argumenta-se que podemos substituir o petróleo por outras fontes limpas, etc.Infelizmente a humanidade não fez planos a longo prazo e não há nenhuma tecnologia energética em mãos para substituir o petróleo - 
na extensão de consumo de energia que ele provê, hoje, em 2010 - OITENTA E CINCO MILHÕES DE BARRIS (um pequeno oceano diário).

E uma observação importante caros amigos: o petróleo é a única forma de energia que pode ser transportada por todo planeta, sem grandes perdas, na quantidade necessária para a crescente demanda energética.
 
O problema do petróleo não é apenas energético, o petróleo está em quase TUDO que nos cerca, é a própria espinha dorsal da economia ... e está acabando, não é renovável. As reservas brasileiras, incluindo o pré-sal, não garantem 150 dias de consumo diário mundial de petróleo,  AOS NÍVEIS DE HOJE !! As reservas brasileiras, sempre aos níveis de consumo de hoje, nos garante uma irrisória autossuficiência de apenas 10-15 anos, até 2020 ou 2025.

Não há saída, teremos um hiato de pelo menos uns 30 anos entre as eras do petróleo e da fusão nuclear (se é que vamos chegar a esta última) porque a economia entrará INEVITAVELMENTE EM DECLÍNIO.

Para enfrentar este tremendo estado de coisas que se avizinha, temos que aprender a dividir, viver com menos e, principalmente, mudar nossa visão de felicidade. Uma política cultural que tenha como base este objetivo: remodelar a felicidade, adaptando-a à escassez ao invés da abundância e ao desperdício, será de importância primordial, existencial.

Ou isso, ou a humanidade não verá a luz do séc. XXII

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Darwin e a Pirâmide Social - Carta a um amigo filósofo

Estava andando pela avenida central de Nova Friburgo, exibindo meu novo adquirido bigode, quando se acerca de mim um estranho: "Gui? Sou fulano..."
Conhecíamo-nos apenas virtualmente, através das listas. Já havíamos tido alguns "pegas pra capá" dialéticos. E agora lá estava em carne e osso o famoso filósofo friburguense me agarrando pelo braço, falando comigo.
Algo assim como se um personagem de história em quadrinhos, digamos o Fantasma, me aparecesse mascarado com o anel de caveira no dedo, sorrindo para mim em qualquer esquina do mundo. Nada demais nestes nossos tempos esquizofrênicos. Fomos tomar um cafezinho, pois o café, já o sabemos, é o combustível dos escribas. Papeamos alguns minutos e nos separamos. Escrevi uma carta de reflexões sobre o conteúdo dessa conversa que compartilho aqui (sem mencionar nomes):



Amigo,
(carta tête-a-tête)

depois que nos encontramos fiquei refletindo sobre algumas coisas que vc disse, e, reverberando ... te envio então algumas das minhas reflexões para que faças o que quiser com elas (aliás, nem é necessário mencionar... pois uma vez que uma ideia sai de uma cabeça e entra em outra, o metabolismo mental de cada um se encarrega do resto...  :-)

1. qdo vc comentou que um nosso amigo comum lhe propos uma reunião entre nós, algo que ele também havia me proposto, e da tua resistência, por querer ficar entre os teus pares, já mais ou menos compartilhadores da mesma visão, etc, para evitar discussões chatas, etc... tive a vontade de te contar sobre como eu aprendi a jogar xadrez (de um modo que estou invicto há uns 20 anos).


Meu tio Luiz era melhor do que eu, quando eu tinha 14 anos de idade.
Fazíamos então jogos abertos, em que se podia voltar atrás se um erro grave fosse constatado por um de nós. Na prática não jogávamos um contra o outro, mas ambos com as pretas e com as negras. Fazíamos comentários, análises. Escrevíamos os jogos, analisávamos depois os erros e as possibilidades mútuas. Anos depois, ao estudar o método científico, dialético, entendi que o objetivo da antítese é fortalecer a tese, não destruí-la.  Tese e antítese são aliadas de uma mesma causa: a causa do aprimoramento da verdade. Vi semelhanças entre o método e a maneira como eu e meu tio Luiz jogávamos xadrez.

No caso da "verdade" filosófica, sociopolítica, como resultante de um processo dinâmico orgânico feito de psiquê, anima, seres humanos (como a vida), ela é e será sempre intangível. Daí a minha teoria da dízima periódica, ou pi, onde o que importa não é o resultado factual, o número exato,  mas a DIREÇÃO CERTA.

Infelizmente, nestes tempos de fim de mundo, onde a economia entra por um gargalho cada vez mais fechado, o meio social se carrega cada vez mais de emoções, sentimentos e motivações baixas. Temos sérias razões para ficar desconfiados do próximo (o Outro é o Inferno - Sartre).

2. Falamos um pouco também sobre a natureza do ser humano e sua relação com a natureza, no sentido darwiniano, a lógica seletiva que constrói a pirâmide social em que vivemos e a máxima de um outro amigo pensador: "O Capitalismo é Invencível".

Deixo a seguinte reflexão:
O Homem é a única espécie que, ao invés de se adaptar ao meio ambiente, faz o meio ambiente se adaptar a si mesmo. Neste sentido não somos mais produto do meio natural, mas produtos do meio humano. Mais do segundo do que do primeiro. F.Gullar diz: "a vida é uma invenção". Sim, invenção cultural. O Homem completamente sem cultura não se diferencia muito de um gorila. As vezes reflito que não podemos mais usar o argumento evolucionista darwiniano: somos, cada vez mais, os próprios desenhistas ou modeladores de nós mesmos. Estamos chegando a um ponto que - através da manipulação genética - poderemos desenhar novos seres humanos, virtualmente, ou fazer mutações humanas (algo agora ainda inadmissível religiosamente ou eticamente, mas que dentro de alguns anos será perfeitamente aceitável, pois sabemos: conceitos éticos se ajustam à realidade, nunca o contrário). Podemos presenciar a criação de espécies híbridas humanas para explorar o espaço ou o fundo dos mares; ou para resistir as condições do terrivel "novo planeta Terra" que se avizinha. Talvez seja este o "fim da humanidade" e o "fim do mundo" como conhecemos.

De qualquer modo, me atirei nesse exercício de ficção científica apenas para demonstrar que, sim,
  podemos (e, nessa altura do campeonato, devemos) assumir responsabilidade sobre a nossa natureza. O capitalismo não é natural à natureza humana ... basta decidirmos o contrário.

Abçs

Gui Mallon

sábado, 23 de julho de 2011

VOLTA AO BRASIL II


Ou seria volta ao Brasil III ?


Na verdade, nesta minha segunda grande batalha para voltar ao meu país, houve viagens esporádicas pra fora. Cheguei em julho de 2008 em Salvador com bilhete só de ida. Recebi na chegada uma fitinha do Bonfim no punho esquerdo, o do coração. Em meados de outubro de 2008 entretanto voltei para Europa à trabalho e para trazer algumas coisas. Voltei em janeiro de 2009 com o Prêmio do Interações Estéticas nas costas. Em fevereiro de 2010 fiquei 20 dias na Suécia trabalhando. Andava sob temperaturas de -14 graus levando uma garrafinha de uísque no bolso da camisa, como se fosse uma espécie de cartão de crédito (era o meu combustível). Aqui já havia descoberto o princípio de um pequeno grande amor, mas ainda não sabia. Quando soube em fevereiro de 2011 já era tarde, fui muito lento, dancei. As coisas nos trópicos tem outra velocidade. Um pouco antes, a catástrofe serrana me jogou numa das maiores crises sócio-econômica-pessoais da minha vida. Estava no habitat natural dos que duvidam de si mesmo; o que eles chamam nos EUA de “deep shit”. Fui obrigado então a voltar pra Escandinávia. Pensei que dessa vez havia definitivamente perdido a batalha. Planejei ficar lá até saber o que fazer, o que pelos meus cálculos não seria antes da chegada do inverno europeu em dezembro. O inverno, nesta altura dos acontecimentos, exerce sobre mim o efeito de repulsão dos campos magnéticos. Dia 14 de junho de 2011 fiquei sabendo que ganhei o “Novos Autores Fluminenses” da Secretaria de Estado de Cultura-RJ. Aí, voltei. Vejam só na foto o meu ar de alívio flutuando sobre a Baia de Guanabara.
Por mais que aqui estejamos, nosso olhar vem sempre de outro lugar, outro tempo.
E este olhar muda a paisagem ...




Quero ficar no Brasil. Por que não consigo?
Existe um duro provérbio-conselho inglês que diz:
”You give people a second chance, never a third”
Dê as pessoas uma segunda chance, nunca uma terceira.
Aqui estou eu na minha segunda chance de volta ao Brasil.

O Brasil que meu olhar encontrou na primeira viagem era mais bonito e sonhador. Quase uma festa. Estávamos embevecidos pelas nossas conquistas em todos os campos, inclusive no campo cultural, e esquecemos de sedimentá-las; questionando e aprimorando através da autocrítica. A autoindulgência ainda não era considerado crime.

Amigos me dizem que eu devo mergulhar na psiquê nacional e ficar calado. “Quem fala muito dá bom-dia à cavalo”, diz um deles. Mas aí eu retruco com a historinha do Sapo e do Escorpião:

O sapo estava para atravessar o rio quando um escorpião aparece e pergunta: “Você não pode me levar para o outro lado?”. O sapo responde de pronto: “Eu heein! Você quer é me dar uma ferroada”. Ao que o escorpião retruca: “Tá louco sapo? Se eu te picar você morre e aí vamos pro fundo do rio eu e você”. Era um argumento lógico e o sapo concordou. Quando estavam no meio do rio o escorpião vai lá e CRAU, enfia o ferrão venenoso no sapo. O sapo solta um grito de terror e exclama desesperado: “O que você fez? Agora nós vamos morrer”. Para ouvir o escorpião dizer: “Sinto muito sapo ... mas é a minha natureza”.

Não há  muito que fazer. Cada um segue a sua própria natureza.
Como diz o samba popular:
Tudo está em seu lugar. Graças à Deus. Graças à Deus.

Gui Mallon









quarta-feira, 13 de julho de 2011

ANNA KARENINA – livro de Tolstoi, e o Amor no Final dos Tempos


O livro se inicia assim: "Todas as famílias felizes são iguais. As infelizes o são cada uma à sua maneira".

A trama gira em torno do caso extraconjugal da personagem que dá título à obra, uma aristocrata da Rússia Czarista que, a despeito de parecer ter tudo (beleza, riqueza, popularidade e um filho amado), sente-se vazia... até encontrar o impetuoso oficial Conde Vronski.

Ela abandona a família pelo seu amor, para descobrir de maneira dolorosa que o Conde era apenas um mulherengo, e que, para ele, ela não passava de uma aventura carnal. A descoberta tira-lhe o sentido de viver e ela termina por suicidar-se. O que essa história tem a ver com a situação atual?

Hoje em dia, apesar de estarmos alcançando os limites dos recursos naturais do planeta, vivemos uma fartura tão grande de tudo, que estamos sempre querendo mais. Somos consumistas atrozes, implacáveis, INSACIÁVEIS. Queremos sempre o último modelo. Há sempre um produto melhor (sonho de consumo) a ser alcançado. A escada da Felicidade nunca chega ao fim. Até o amor se submeteu a essa lógica da voracidade. Até o amor virou objeto de consumo e passou a ser descartável, substituível.

Quem ama de verdade sabe que tem um pacto de felicidade: Não se pode ser feliz deixando a ex-pessoa amada infeliz atrás de si. Quem ama (ou amou) tenta cuidar do sentimento alheio, ainda que – sabemos - ninguém pode se responsabilizar INTEIRAMENTE pelos sentimentos de outrem.

Mas... ainda há tempo para estas delicadezas?

______

Por que postei essa reflexão?
Por nada. Estou livre, descompromissado ... mas cuidando sempre de quem cuida (ou cuidou) de mim

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Moto Perpetuo


Concerto de Friburgo

Nenhuma direta motivação/implicação sociopolítica econômica, apenas o fazer musical para um momento que nasceu de outro momento. Nenhuma subvenção, logomarca, agradecimentos a editais de instituições públicas ou privadas, autarquias ou DAs ... a música e o evento estão sendo subvencionados pelas pessoas que desejam este momento: nós mesmos, alguns friburguenses que ainda estão tocados no fundo da alma pela tragédia do dia 12 de janeiro.

Um memorial musical. Parcialmente improvisado, parcialmente reconstruído dos clássicos. Entrarei no palco levado pelo coração (por mais piegas que isto possa parecer, mas é a verdade), com nenhuma intenção outra que não seja compartilhar um momento com outras pessoas.

Por si só algo raro no nosso meio cultural, algo religioso, (de religare), mas sem instituições de qualquer natureza diretamente envolvidas.

Que momentos serão plantados deste momento é algo que só posso imaginar, mas sei que independente de qualquer expectativa, o amor sempre gera frutos por si só.

O Amor é o tal do "moto perpetuo".

quinta-feira, 14 de abril de 2011

violeta

VIOLETA 






O que é o que é?


Algo qualquer
lugar nenhum
momento breve
fugidio
violeta
entra em nós
(invisível)
tornando palavra
imagem, odor, sentimento
num ecoar iluminado




 ou como diria a voz ancestral:
             “farol incrustado
                          no campanário
                                                              d’alma”





Algo mais amplo
e profundo
que a reminiscência


O que é o que é?


Leve dor suave
dor leve alegre
branda dor
suave e
violenta





Saudade


domingo, 6 de março de 2011

São Paulo S/A. a ministra Ana de Hollanda e a gestão participativa

O que São Paulo S/A(*) tem a ver com a ministra Ana de Hollanda e com gestão participativa?
* um dos melhores filmes nacionais de todos os tempos - dirigido pelo paulista Luis Sérgio Person


No dia seguinte à sua posse, na verdade menos de 24 horas depois, a nova Ministra de Cultura Ana de Hollanda já sofria ataques implacáveis nas listas e blogs dos ongueiros do velho regime.  O motivo/pretexto? O discurso de posse, onde a ministra expressou sua visão em linguagem metafórica:  "a criação será o centro do sistema solar de nossas políticas culturais e do nosso fazer cotidiano. Por uma razão muito simples: não existe arte sem artista". Estes ataques foram gradativamente aparecendo na midia nacional, atingindo seu atual ápice no lamentável episódio das ofensas públicas de Emir Sater a ministra.

É certo que a frase não foi colocada no discurso de posse intencionalmente com o intuito de polemizar, mas a simples menção das palavras “arte” e “artista” sempre causou um certo mal estar num meio cultural hoje dominado por gestores, produtores & ONGs. Sem entrar no mérito da questão do que é arte ou artista, simplesmente referir-se a arte, artista e direitos autorais neste meio é um convite a ser qualificado como adepto do “retrocesso”.

Realmente, depois de se exporem a humilhação de ver a plêiade dos candidatos que apoiavam (supra-sumo da intelectualidade burocrata da velha escola política - na sua maioria com raízes em São Paulo) preteridos por uma artista carioca “outsider” do sistema de política cultural implantado pelo MinC de Juca (o ministro gestor de fato de toda a gestão Lula), a comunidade de ongueiros e lobistas estava já eriçada e predisposta ao confronto desde o momento do anúncio do nome da nova ministra. O que está em questão aqui não são as propostas da nova gestão (que ninguém se deu ao trabalho de esperar serem definidas), mas os oito anos de monopólio ideológico das políticas culturais que se considerava incontestável.

Essa incontestabilidade foi fundamentada no conceito de gestão compartilhada emanado das experiências com orçamento participativo. A constituição de 1988 incorporou o direito ao exercício direto da cidadania como um dos pressupostos do Estado Brasileiro, razão pela qual são crescentes as inovações institucionais e legais tendo em vista ampliar o alcance da participação popular nas políticas públicas. A Constituição de 1988 foi feita dentro deste espírito, tendo inclusive um Plenário Pró-Participação Popular na sua Constituinte. Mas uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa.

Na forma como foi praticado nas políticas públicas do MinC-Juca, o problema que este método criou foi o da LEGITIMIDADE DE REPRESENTATIVIDADE. Colocar 100 ou 3000 pessoas num auditório em conferências extremamente desorganizadas, sem um critério jurídico claro de seleção de participantes, em que todos gritam e ninguém escuta; um processo obscuro e não-transparente no qual um redator escreve as propostas que depois vão ser selecionadas e colocadas em papel por outro “relator”, muitas vezes previamente escolhidos ninguem sabe por quem - é uma maneira genial de criar-se uma sensação festiva de participação democrática em meio ao caos. O título do encontro da Teia 2010 em Fortaleza incluia, emblematicamente, a palavra “Tambores”. Eu pessoalmente, tendo como base as cerca de 10 conferências e encontros dos quais participei, considero este método uma forma de estelionato político da democracia. Ou, simplesmente, apropriação indébita de representatividade popular.

A representatividade é um dos baluartes da democracia, pois é impraticável (pelo menos por enquanto) colocar os 190 milhões de brasileiros no Plenário da Câmara ou do Senado. Por isso temos o que chamamos de Democracia Representativa. Esta representatividade segue regras jurídicas claras, enquanto no caso das “plenárias” promovidas pela gestão do antigo MinC os participantes eram convidados entre artistas , produtores, lobistas relacionados aos pontos de cultura ou outros programas, ou seja, dentro de sua própria clientela política. A prática criou um paradoxo jurídico e ético:
O objetivo do Orçamento Participativo é incluir o “povo” nas decisões orçamentárias que os beneficiam mas, na impossibilidade de colocar “o povo” inteiro sentado frente a frente com os seus gestores, busca-se REPRESENTANTES populares. Quando estes representantes, em número reduzido, participando de um processo de decisão seletivo (porque a economia é a ciência da escassez, ou seja, da seleção entre opções econômicas), tomam decisões que beneficiam a si próprios cria-se um problema ético-jurídico: o conflito de interesses. Este princípio ético-legal é a razão pela qual nos editais ou licitações não se permite aos membros das bancas examinadoras premiarem a si próprios, amigos ou parentes.

Passei um ano apontando para este problema nestas reuniões e sendo olhado com curiosidade, como se fosse uma espécie de profeta Gentileza perdido no meio do trânsito na hora do rush.

Em matéria publicada no jornal O Estado de São Paulo, a gestão do PC do B no Ministério dos Esportes é acusada de turbinar caixa e políticos do partido, alegadamente distribuindo 30 milhões a ONGs, dirigentes ou aliados do partido. O jornal percorreu núcleos esportivos no DF, GO, PI, SP e SC e flagrou convênios com entidades de fachada, situações precárias e de abandono. (matéria completa aqui). O partido também geriu importantes recursos públicos do MinC durante a gestão Lula. Que se saiba, até agora, e em nenhum momento, foi feita alguma sindicância que pudesse aprofundar o entendimento sobre os fatos e as consequências das práticas desta “gestão compartilhada” aplicadas improvisadamente nas políticas públicas culturais. Esta auto-avaliação seria uma condição si ne qua non para uma evolução destas políticas públicas. Ao optar-se pelo caminho da incontestabilidade fechou-se o da dialética. E é uma pena, porque política pública também é ciência.

Walmor Chagas como Carlos no filme São Paulo S/A, de 1965 (cult)


São Paulo S/A, de 1965, mas com enredo situado na década de 50, é um dos filmes mais reveladores e emblemáticos da cinematografia nacional porque denuncia o cínico pragmatismo que a expansão industrial daquele estado impôs ao país, padrões que podemos identificar hoje na cultura política do Brasil. O desenvolvimentismo sem critérios que se implantou desde então continua a dar as cartas tanto na economia, quanto na política e na cultura. Continuamos a optar por dar prioridade (como na década de 50) aos fins antes dos meios; a quantidade ao invés da qualidade. Diante do imenso desafio da problemática ambiental, mais que denunciar, temos que enfrentar estes dogmas pragmáticos.

O filme é ótimo e atual. Recomendo veementemente.

Gui Mallon
músico, escritor e artista plástico

assine o