domingo, 30 de setembro de 2012

FRIBURGO

 
Minha primeira visão do centro de N.Friburgo, em dezembro de 1962


A família carioca alugou uma casa em Mury, no início do verão, em dezembro de 1962. Mury era como se fosse outro município: quem lá morava, lá ficava. O último ônibus de Friburgo para Mury creio que saía no horário de 14 ou 15 horas (a FAOL, como sempre, muuuuuito pragmática e muquirandopolitana). Creio que visitei o centro de Friburgo umas duas vezes, no máximo. Destas ocasiões lembro-me claramente do trem que passava, curiosamente, no meio da avenida central da cidade. E de uma loja de chocolates suiços, muito apreciada por todos, que já não me lembro onde ficava. Lembro-me que nestas nossas visitas ao centro eu comia chocolates e via o trem passar bucolicamente, como se fosse um imenso animal selvagem domesticado desfilando em uma parada circense. Hoje eu gosto de imaginar que, ali perto de onde eu estava vendo o trem cruzar a avenida Alberto Braune, mulheres grávidas estavam circulando pelas ruas da cidade, e iriam neste mesmo ano parir pessoas que iriam entrar na minha vida anos mais tarde, de maneira significativa, na forma de amizades, alunos, amores. Este pensamento "magnifica" o significado deste singelo momento que vos descrevo, apesar de, no exato momento em que eu o vivenciava, ele não ter significado nada mais do que o inocente usufruir do sabor de um chocolate somado a visão de um trem.



 
Na casa alugada havia uma piscina, localizada ao lado de um campinho gramado, verdinho, onde eu jogava futebol com outras crianças. À noitinha este campo povoava-se de sapos enormes, que faziam grande algazarra e tentavam invadir nossa casa. Mas isto, agora, eu não sei dizer se era real ou parte dos meus sonhos. Eu tinha oito anos de idade e adorei aquele lugar, apesar de sentir frio, mesmo no meio do verão.

Eu fiz amizade com um garoto friburguense, lourinho de olhos azuis, que gostava de empoleirar-se escondido no alto de um morrinho, para jogar pedras de barro em cima dos carros que passavam na estrada lá embaixo e sair correndo depois pela mata adentro. Eu passei a acompanhá-lo nessas aventuras, mais para observar. Um dia ele atingiu um carro preto, que freiou violentamente, saindo lá de dentro um homem vestido de terno preto e óculos escuros. Ele nos viu correndo para a mata e gritou algumas coisas que não entendemos, mas que nos assustou o suficiente para não repertirmos mais a experiência.

As férias acabaram e eu voltei pro Rio. Aquele menino friburguense nunca mais vi. A casa alugada já não consigo lembrar-me onde ficava. O trem  um dia foi embora e nunca mais voltou. O homem de óculos escuros visita meus sonhos às vezes. A loja dos chocolates que continham licor, ao final, acho que ficava em Mury mesmo. A montanha que aparecia por detrás do trem já não aparece mais nos cartões postais ... e parte dela desabou no dia 12 de janeiro de 2011, arrastando um prédio e causando a morte de muitas pessoas.

Eu posso apenas imaginar o que aconteceria, hoje em dia, se dois meninos atirassem pedras em carros, ainda que fossem pedras de barro, provocando freiadas e a ira de motoristas vestidos de preto com óculos escuros. Estes meninos certamente correriam um grande risco de levarem um tiro.

2 comentários:

  1. Lindo recuerdos de infancia, más importante reflexión de los peligros de tirar piedras a los autos, como usted dice, muchos meninos y no tan meninos llevaron un tiro, o una golpiza o la condena social por hacerlo, inclusive en muchas manifestaciones.
    Recuerdo Friburgo de los años '70, pero la parte campestre, los arroyos, los campos con flores y mi felicidad a flor de piel. Un abrazo amigo!!

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  2. Sim, amigo ou amiga.
    Teu comentário me fez refletir.
    Metaforicamente, o "homem de oculos escuros" foi severo, mas uma severidade benigna, daqueles tempos. Não puxou uma arma, não atirou nem matou os meninos, coisa que hoje em dia não seria de todo incomum. A severidade excessiva com as falhas menores das crianças já criou mais de um neurótico. Lembrou-me um ditado árabe:
    "Cuidado para não castigar excessivamente um menino, pois amanhã ele cruzará teu caminho como homem formado".

    ___

    Sí, amigo o amiga.
    Su comentario me hizo reflexionar.
    Metafóricamente, el "hombre con gafas de sol" fue duro, pero con una severidad benigna de aquellos tiempos. No sacó una arma de fuego para tirar o matar a los niños, algo que hoy no sería nada raro. La excesiva severidad a las faltas leves de los niños ya ha creado más de un neurótico. Me recordó un dicho árabe:
    "Tenga cuidado de no castigar demasiado a un niño, porque mañana quizas cruze su camino como un hombre formado".
    Abz

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